21 de junho de 2008

Chão

Eu não sei o que acontece
quando as vista se escurece
e me faia o coração;
bate um medo desgraçado
de viver amargurado
por largar o meu sertão.
Toda noite numa prece
peço a Deus que se interesse
por nóis fio desse chão
- que crescemo co’as promessa
de político com pressa
de ganhar as eleição.
Peço a Deus do céu que ajude
dando a nóis muita saúde
pra seguir na procissão
- que é de fé e de esperança,
co’as muié e co’as criança
que vão dando a direção.
Que tortura a nossa vida,
não tem cama nem comida,
nem feliz recordação.
As lembrança são da fome
que matara nossos home
nas batalha pelo pão.
Nóis não sabe se tem sorte
por tá vivo ou se é co’a morte
que nóis vai tê solução;
mais nóis sabe que da terra
nóis num larga nem com guerra
nem com tiro de canhão.
Pode vir o mundo abaixo,
coronel com seus capacho,
que nóis vai brigar de mão:
nóis não ‘tamo de saída,
severina é nossa vida,
nóis não larga desse chão.

19 de junho de 2008

Senhor

Tira, Senhor, a minha vida
Tira, Senhor, o que quiseres
Tira, mas deixa-me as feridas
- marcas deixadas por mulheres

Tira, Senhor, a minha luz
Cobra, Senhor, os teus favores
Grave, porém, na minha cruz
Morto, ferido por amores

Ouça, Senhor, os meus apelos
- dores em forma de palavras
Pesos que fiz por merecê-los,
crendo, porém, que me salvava

Tira, Senhor, a minha sorte,
sorte de dores e fracassos!
Manda, Senhor, enfim, a morte
- quero dormir em seus abraços

12 de junho de 2008

Agradecido

Quando o semáforo fechou, parei o carro atrás de uma van. Ela era enorme e impedia a visão de qualquer outra coisa além do cruzamento. Era um sinaleiro lento, relativamente demorado e instalado em uma importante avenida da cidade. Quase todos os dias eu parava ali, consumindo alguns minutos de um tempo que eu não achava ruim perder. Era o tempo de trocar um cd, enviar uma mensagem ou ligar para alguém – tempo suficiente para realizar pequenas coisas que não ganhavam importância ao longo das outras horas do dia. Naquele sinaleiro, essas pequenas coisas mudavam de status e passavam a ser prioridade – pelo menos enquanto o sinal vermelho demorava-se em tornar-se verde. Naquele dia, dia em que uma imensa van obstruía a minha visão, um veículo funerário parou ao meu lado impedido de seguir em frente pela força ameaçadora de um radar interligado ao semáforo. Carregava um caixão, coroas de flores e era seguido por uma fila de outros carros com os seus pisca-piscas ligados. Não era a primeira vez que eu via um caixão, contudo, era a primeira vez que eu compartilhava com um morto um tempo dedicado à espera de um sinal para seguir em frente na vida. Naquele momento, enquanto um sinal vermelho impedia a passagem de vivos e mortos, os contrastes entre a nudez do dia-a-dia e os mistérios da morte tomaram a minha mente. Com um olho no semáforo e o outro no caixão, pensei sobre a minha própria vida, a provável vida daquele que estava no caixão e os caminhos, ou descaminhos, que o levaram a parar naquele cruzamento. Entretanto, ainda sob a ordem colorida de permanecer parado e em meio a pensamentos sobre o a vida e os seus trânsitos, logo a minha atenção voltou-se ao carro que estava parado atrás do veículo funerário. Era um carro pequeno, estava quase ao meu lado. Nele, ao lado do seu motorista, encontrava-se uma jovem entristecida que, moderadamente, deixava algumas lágrimas escorrerem pelo rosto. Não precisei mais do que brevíssimos instantes para notar que todos os ângulos do seu rosto eram perfeitos. Ela era linda. Seus olhos, claros e mareados, oscilavam entre alguns momentos fechados, consternados, e o olhar direcionado ao veículo funerário posicionado a sua frente. Nesses instantes, instantes em que seu olhar direcionava-se ao caixão, a sua dor era visível e, sua beleza, inquestionável. Confesso que, após avistá-la, nada mais ao meu redor chamou-me a atenção: a partir daquele momento, toda a minha sensibilidade voltou-se para a percepção e a compreensão daqueles extremos que, para mim, sintetizavam a experiência humana – a vida, a beleza, a dor e a morte. Tomado por pensamentos e sentimentos irresistíveis, continuei a observá-la até o momento em que o trânsito obrigou-me a colocar-me em movimento. Quando passei pelo semáforo, não mais senti que estava apenas dirigindo e prosseguindo com a minha vida – alguma coisa mudara em mim, e a um morto, e a uma bela, eu passara a ser eternamente agradecido.

4 de junho de 2008

That's the question

Desistir.
Existir.
Desistir.
Existir.
Desistir
de existir.
Desistir.
Esistir.
Desistir
de esistir.
Dexistir.
Esistir.
Dexistir
de esistir.
Desistir.
Esistir.
Desistir
d esistir
- eis a questão.