10 de abril de 2008

Sentimento

Nunca havia experimentado um sentimento tão intenso. Nada em sua vida comparava-se ao que estava sentindo, coisas que ocupavam a sua mente, todo o seu peito e, sobretudo, o seu coração. Na verdade, nem mais podia referir-se a qualquer uma das suas partes como suas partes. O remorso tomava-lhe uma a uma, às vezes de maneira sutil, às vezes de forma estúpida e dolorosa, arrancando-lhe lágrimas, suspiros e toda a esperança que tinha na vida. Não possuía mais esperanças, nenhuma, nenhumazinha capaz de lhe dar qualquer força, apetite, equilíbrio ou alegria. Alegria – nem mais sabia o que significava tal sentimento, tão estranho e abstrato quanto uma pérola em meio à lama, em meio ao lixo. Quando fechava os olhos, inundava-se de arrependimentos angustiantes que lhe sufocavam a alma e torturavam-lhe o coração. O remorso – o pior sentimento com o qual já havia se encontrado, o mais negativo, o mais poderoso e o mais difícil de ser expurgado, colocado para fora ou deixado de lado – fundira-se a ele. Como queria sentir raiva, desprezo ou qualquer outra coisa. Mas só sentia remorso – remorso, remorso e remorso. Um remorso profundo, com grandes raízes, entranhado em seu peito e em todos os cantos da sua alma de dor. Se pudesse fazer alguma coisa, refazer os caminhos que à desgraça o levaram. Mas não. Todos os caminhos estavam impedidos e apenas o remorso a abraçar-lhe com força, por dentro e por fora e de todas as formas, deixando-o fraco, perdido em si. O que fazer?, perguntava. Mas nada enxergava a não ser o remorso, o pior sentimento, o mais cheio de dor, o da culpa opressora, o do ódio a si mesmo sem trégua e perdão. O que fazer? O que fazer?, perguntava e ouvia o remorso a dizer: “nada, rapaz, não há nada a fazer".

Um comentário:

Anônimo disse...

A ênfase dado o texto todo a remorso, reforça os tracos do produtor, utilizando da metalinguagem para voltar-se ao fundo da alma...Contudo para quem te conhece (adora, e admira...sente saudades por estar um pouco ausente) sabe que tal recurso linguistico, utilizado como uma forma de distanciamento do autor e obra, nesse caso configura o autor personificado...
super beijos...